É tempo de refletir

Início do ano é tempo de reflexão, assim, com a Copinha e a forma de jogar dos times de base levantamos alguns questionamentos e apontamos poucos esperanças na mudança do futebol brasileiro para o futuro.


O início do ano é tempo de reflexões e também da Copinha, o principal campeonato de base do país. Taubaté e Manthiqueira, dois dos clubes do Vale, únicos que disputam este torneio, foram eliminados na primeira fase.

Mas algumas coisas vem me chamando a atenção, não é só dentro de campo mas com coisas que ocorrem extra campo também, uma das coisas, extra campo, diz respeito ao crescimento das mídias institucionais dos clubes, as TV dos clubes em especial, feitas por profissionais dos próprios clubes, que na maioria da vezes enfatiza a vitória e apaga as derrotas da história. Estrategicamente esse trabalho é divulgar o clubes e suas as ações, em especial os bastidores como os treinos e os vestuários antes e após os jogos, trabalho que expõem a marca e busca uma maior aproximação com seus torcedores, assim, é compreensível a linha de atuação executada por essas mídias.

Mais uma coisa extra campo, que vem me chamando a atenção são os discursos dos técnicos, a todo momento vemos e ouvimos as suas justificativas. Muitas das vezes parecem que estavam em outro jogo, diferente do que nós assistimos. Me baseando em alguns argumentos criei algumas frases hipotéticas, acho que de tanto ouvir as sabatinas dos técnicos brasileiros, segui: o jogo se resumiu a um primeiro tempo, que com mérito soubemos tirar proveito da vulnerabilidade defensiva e aproveitar os espaços em campo deixados pelo adversário; conseguimos imprimir um contra-ataque e aproveitar os erros primários do adversário; mérito do nosso time, que taticamente foi muito bem e souberam colocar a bola no chão; com velocidade, intensidade e criatividade, nosso time abriu os espaços e marcamos os gols que nos deram a vitória; a estratégia do nosso time para o segundo tempo foi esperar as iniciativas do adversário. Obrigatoriamente após os jogos os técnicos vão até a sala de imprensa e explicam suas estratégias de jogo e uma oportunidade de expor seu conhecimento sobre a matéria.

Nunca deixei de me posicionar aqui nesta coluna minha defesa do futebol para cima, que prioriza o ataque e que procurar incansavelmente o gol, desta forma, a partir da minha maneira de ver o jogo perdi o interesse pelas partidas sem graças, que priorizam o resultados. E ver os jogos na Copinha e observarem a maioria dos times abrirem mão de jogar o jogo me traz algumas reflexões no sentido de imaginar: o que fizeram ou estão fazendo com o futebol brasileiro? Qual seria seu futuro?

Essas perguntas me vem ao acompanhar a Copinha, importante torneio de base do futebol brasileiro e assistindo os jogadores na base, aponto que os meninos não estão sendo ensinados a buscarem o gol por todo o jogo, ou seja, por todo os 90 minutos. Reflito e vejo pouca mudanças na formação do jogador e dos times, não vejo nada de diferente, mas sim uma padronização, que me incômoda profundamente.

Sabemos que é muito mais fácil falar do sofá ou da arquibancada do que executar dentro de campo e muita mais difícil ainda ser treinador de um time.

Do sofá ou arquibancada julgamos o trabalho dos técnicos, muitas das vezes baseado no direcionamento da mídia, nos resultados do trabalho e de forma simplista, se o técnico ganha é bom e se perde é ruim. Dentro da nossa concepção e maneira de ver o jogo indicamos nossos apontamentos, se sou adepto a um estilo de jogo, seja ele de força, de uma bola, contra-ataque, arte, independente do nome, vou defender as posturas tomadas pelo técnico, seja ela, em determinadas circunstâncias de um determinado ou criticar. Mas qual o parâmetro que defino ser o um jogo bem jogado, na minha forma de ver o jogo quero que meu time busque o gol por todo o jogo, ou seja, todo os 90 minutos, tenha intensidade, jogue para frente, se tiver de ganhar por 5 ou 6 que ganhe, assim, ganhará a confiança necessária para os jogos seguintes e o respeito dos adversários na competição. Como dizia Muricy Ramalho, a bola pune! E ela iria punir quem?

Sabemos das inúmeras variáveis que estão em jogo na preparação de um time de futebol, desde as relacionadas a cultura do jogador aos aspectos físicos necessários para a execução das jogadas, passando pela harmonia dos aspectos técnicos com os táticos. Não podemos desconsiderar cultura do jogador, contexto de formação, formulação, aplicação e organização da metodologia de trabalho empregado, assim, esta são algumas das variáveis na tomada de decisões da equipe técnica, a observação e avaliação devem fazer parte constante desse processo e auxiliar os caminhos metodológicos da comissão.

O debate continua nas ruas, bares, praças, festas de família, assim, uns vão dizer que é inteligente esperar a iniciativa do jogo, outros irão dizer que buscar mais o gol no jogo e não ter ficado lá atrás se defendendo e o mais correto no futebol. Mas como disse, são muitas as variáveis e vemos apenas o que é visível nos jogos como o desgaste físico pela intensidade das partidas e competições, e não vemos outros aspectos a não ser os discutidos pelas mídias, devemos ampliar nossa visão para o futebol e buscar enxergar para além das quatro linha, como dizia Nelson Rodrigues: o pior cego é aquele que só vê a bola.

Historicamente o aspecto cultural era o que diferenciava o jeito de jogar do brasileiro e isso foi se perdendo ao mesmo tempo que se enfatizou a preparação física, não estou julgando esse mudança e nem desmerecendo os trabalhos dos treinadores, dentro de uma lógica atual de trabalho vejo bons trabalhos sendo realizados, meu questionamento é sobre essa lógica que desprivilegia os característica individuais dos jogadores e isso nos custou muito caro e não vejo ninguém pensando de uma outra forma, assim, minhas perspectivas para o futebol brasileiro não são das melhores. Como já escrevi outras vezes nesta coluna devemos repensar o futebol como um todo.

 

Téo Pimenta é professor universitário, diretor do Instituto Esporte Vale (IEVALE), profissional formado em Educação Física, especialista em Educação e mestre em Desenvolvimento Humano. Procura refletir e compreender o fenômeno esporte nas suas diferentes dimensões. Colunista no AgoraVale desde 2018.