3 historiadores recentes que ajudam a explicar o Brasil

De Felipe de Alencastro a Laurentino Gomes, nova safra de autores ainda olha para o período da escravidão em busca de respostas ao país



Se a maioria dos historiadores brasileiros ainda vivos são conhecidos por obras que produziram há décadas - como José Murilo de Carvalho e Boris Fausto - ou ainda exista muita referência aos autores já mortos, como Sérgio Buarque de Holanda e Florestan Fernandes, uma nova safra de escritores dedicados à história do país está em pleno funcionamento.

São os casos de Luiz Felipe de Alencastro, professor do curso de História do Brasil da Universidade de Sorbonne, em Paris, na França, Laura de Mello e Souza, professora de História Moderna do curso de graduação da Universidade de São Paulo (USP) desde 1983 e José Laurentino Gomes, jornalista de formação, mas que abraçou a profissão desde que publicou seu primeiro livro, o best-seller 1808.

O principal livro de Felipe de Alencastro está completando 18 anos - tempo suficiente para tê-lo tornado uma referência ao estudo histórico do Brasil. Em O Trato dos Viventes, ele mostra como, durante o período de colônia de Portugal, o país fazia parte de uma rede de circulação de navios negreiros que operava na parte sul do Oceano Atlântico, abastecendo “mercados” no Brasil, no Rio da Prata e até na China.

"Percebi que 95% dos navios que trouxeram africanos para o Brasil entre 1550 e 1850 saíram de portos brasileiros para outros lugares. Estamos falando, então, de uma rede no Atlântico Sul que é o elemento essencial, transcontinental, de formação do Brasil", afirmou em entrevista à revista Estudos Históricos, da Fundação Getúlio Vargas, em 2015.

Neste ano, Alencastro lançou seu quarto livro: The Trade in the Living, à venda nas livrarias europeias, onde o autor segue na sua linha de pesquisa, mostrando como a escravidão africana era um elemento essencial no Atlântico Sul e no progresso da coesão da América Portuguesa, enquanto, ao mesmo tempo, os interesses concretos dos colonos brasileiros, dependentes do negócio de negros da Angola, estavam violentamente afirmados na África para garantir que homens e commodities continuassem circulando pelo Atlântico.

Já Laura é autora de O sol e a sombra, de 2006, livro que venceu o Prêmio Jabuti de Melhor Livro de Ciências Humanas no ano seguinte. Nele, a escritora reflete sobre o que permitiu o controle de Portugal sobre o Atlântico Sul durante o século XVIII, em um momento que marcou uma nova concepção de império para a metrópole europeia.

Apesar da obra famosa falar sobre administração política, Laura também se interessa por religião - não à toa dois de seus principais livros falam sobre o assunto: O Diabo e a Terra de Santa Cruz: feitiçaria e religiosidade popular no Brasil colonial, de 1986, e Feitiçaria na Europa Moderna, do ano seguinte. "O historiador não pode ficar só no particular. É a história da floresta: se vemos a árvore, temos que ver a floresta, senão a compreensão fica prejudicada", disse em entrevista à Revista Fapesp.

Por fim, o trabalho de Laurentino Gomes é mais popular: em 2007 ele lançou seu best-seller 1808 e, anos mais tarde, a continuação com 1822. Juntos, os dois livros venderam 1,2 milhão de cópias no país. Os títulos falam por si mesmos dos temas tratados: no primeiro, o autor conta a história da chegada da corte portuguesa - incluindo o rei D. João - ao Rio de Janeiro, no começo do século XIX. No segundo, ele explica os acontecimentos que rodearam a proclamação da Independência brasileira pelo imperador D. Pedro I.

Laurentino ainda publicaria o terceiro livro da trilogia, 1889, sobre a proclamação da República pelo marechal Deodoro da Fonseca e o início do governo dele e do seu sucessor, Floriano Peixoto.

Para ele, o mais importante na produção de um livro de história é a facilidade do seu acesso por parte dos leitores - algo incomum na academia brasileira. "É essencial ter linguagem acessível e fácil de entender. É preciso ter uma boa fórmula de capa e título para atrair o leitor, algo que até hoje é pouco explorado pelo mercado editorial brasileiro. É bom ter também o senso de oportunidade, aproveitar datas e grandes acontecimentos", conta.

Desde o ano passado, Laurentino trabalha em seu novo projeto: uma série de livros sobre a escravidão ao Brasil nos mesmos moldes de sua trilogia anterior, com linguagem acessível e técnicas jornalísticas. Ele vive entre Lisboa, capital de Portugal, e países da África, desde outubro de 2017.